quinta-feira, 25 de novembro de 2010

"A morte de um amor"

"A morte de um amor é como a morte de uma pessoa amada. Deixa a mesma dor, o mesmo vazio, o mesmo desprezo de se entregar àquele vazio. Mesmo que ela tenha sido aguardada, feita por autodefesa ou bom senso ou até mesmo por necessidade de liberdade, quando ela chega você se sente inválido. Mutilado. Parece que você ficou com um olho só, uma orelha só, um pulmão, um braço só, uma perna só, o cérebro dividido, e não faz outra coisa a não ser invocar a metade perdida de você mesmo: com ele ou com ela você se sentia inteiro.

Ao invocá-la, você não se recorda nem mesmo de suas culpas, os tormentos que lhe afligiam, os sofrimentos que lhe foram impostos. A lembrança saudosa lhe traz a imagem de uma pessoa preciosa, ou melhor, extraordinária, de um tesouro único no mundo e não adianta nada dizer a si mesmo que isto é uma ofensa à lógica: um insulto à inteligência, um masoquismo (no amor, a lógica não serve, a inteligência não ajuda, e o masoquismo é digno de um psiquiatra).

Depois, aos poucos, passa. Talvez, sem que você esteja ciente de que a dor se libera, se dissolve, o vazio diminui, o desprezo de se entregar a este vazio desaparece. Você, finalmente, se dá conta de que o objeto do seu amor não era nem uma pessoa preciosa, muito menos extraordinária, e nem um tesouro único no mundo.

Você a substituiu com outra metade, ou suposta metade de você mesmo, e por um certo período, recupera a sua inteireza. Mas, em sua alma, permanece uma ferida que a enfeia, um sinal negro que a desfigura, e lhe ocorre de não ser mais aquele ou aquela que era antes do luto. A sua energia enfraquece, a sua curiosidade também, e sua confiança no futuro se perde porque você descobriu que se esvaiu um pedaço de existência que ninguém lhe reembolsará.

Até porque, se um amor diminui sem remédio, você se cura e se esforça para sará-lo. Até porque, se você está em estado de coma agonizando, você busca reenviar o instante do último respiro: você o mantém e em silêncio o suplica para viver ao menos um dia, uma hora, um minuto. Até mesmo porque, enfim, quando se deixa de respirar, você tenta esquecê-lo ou, até mesmo, tenta ressuscitá-lo. Levante-se Lazzaro, e siga em frente." - Oriana Fallaci, "Insciallah"

Eu conheci este texto em uma aula de italiano. Fiz uma tradução livre porque ele me emocionou. Todo mundo passa por um término de relacionamento mais cedo ou mais tarde. Ele sempre fará sentido em algum momento de nossas vidas, portanto ficará registrado aqui.

Ps: Para quem quiser ler o texto original, o link é este aqui: http://migre.me/2sSHK

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Leia primeiro este post antes de decidir se gosta ou não de Harry Potter

Todo mundo tem o direito de discordar, mas ninguém tem o direito da ignorância. É com esse objetivo que estou aqui escrevendo esse post. Ninguém é obrigado a gostar de Harry Potter ou ler os livros ou ver os filmes. Mas, em compensação, ninguém pode falar mal sem antes conhecer. Isso é ignorância. Essa idéia, de que você deve primeiro conhecer para saber se gosta ou não de algo, serve pra tudo na vida: livros, jogos, filmes, pessoas, culinária, política, enfim, antes de decidir qualquer coisa, conheça primeiro, porque assim, o seu argumento, seja ele favorável ou não, terá fundamento, e não estará apenas (mal)apoiado na ignorância.

Sabe quando você vai a uma festa fantasiado? Por fora você pode até parecer outra pessoa, mas por dentro, continuará sendo você mesmo. É assim que funciona com a história de Harry Potter. Por fora, você vê bruxos, elfos, duendes e tantas outras criaturas mágicas, varinhas, feitiços, um mundo mágico. Mas por dentro, ou seja, o coração da história, o que se vê é a simples reprodução do nosso mundo. Do mundo que nós vivemos ontem e continuamos vivendo hoje, mostrando que ainda não aprendemos com os nossos erros.

No filme, um batalhão de bruxos quer exterminar os humanos por acreditar que eles sejam a escória da sociedade. Acho que nós já vimos essa mesma história há algumas décadas atrás, com aquele monstro alemão que tentou espalhar a sua perversidade e sujeira pelo mundo utilizando o mesmo argumento. Mas infelizmente nós continuamos a ver essa história todos os dias, através da discriminação, da homofobia, da xenofobia, enfim, de todas essas mazelas que estão constantemente nas manchetes dos jornais mundiais. Ou seja, a autora de Harry Potter não faz nada mais a não ser reproduzir a nossa triste realidade, apenas vestindo-a com uma fantasia diferente.

A busca insaciável pelo poder, a ganância, a soberba, as guerras que matam mais inocentes do que vilões, e todas as nossas outras velhas conhecidas moléstias que assolam o mundo, estão contadas na história do bruxinho de óculos redondo.

As nossas armas que matam com um movimento simples de um puxar de gatilho também estão lá, mas na forma de varinhas mágicas que são acionadas com o sussurro de algumas palavras.

A maldade, que parece tão maior quando vista na tela do cinema, interpretada pelo impecável Ralph Fiennes, é a chaga que a nossa sociedade tem carregado todo esse tempo, que nos deixa doentes, que mata inocentes, que destrói famílias, que deixa o nosso mundo, cada dia mais, agonizante.


Não é por isso que você deve ou não da gostar da saga de Harry Potter. Mas antes de emitir qualquer comentário, conheça o que a história quer realmente passar. Esqueça o mundo mágico, os bruxinhos adolescentes, as criaturas mitológicas. Pense que a história é um alerta para todos nós: nosso mundo está doente e ninguém está se esforçando o suficiente para tentar curá-lo. É a arte imitando a vida. O que difere, no entanto, é que o filme tem um final feliz. Se nós não lutarmos, talvez não tenhamos essa mesma sorte.